Um conto de natal – zoom out

Era uma vez a Fabiana, uma mulher na faixa dos trinta anos, que se encontrava um tanto monótona, ela decidiu, num certo momento, juntar-se a um grupo com o propósito de partilhar conhecimentos, valores e princípios específicos com crianças – possivelmente plantar as sementes de bondade que o mundo tanto carecia. No entanto, engane-se quem pensou que esta história se trata realmente da Fabiana ou das crianças.

Curiosamente, a Fabiana, na sua inocência, acreditava piamente que a narrativa envolvia crianças e a transmissão de valores.

O grupo era composto por cerca de vinte pessoas, cada uma com motivações um tanto questionáveis, carregando mochilas de campismo pesadas, mas não cheias de experiências de vida ou algo do gênero – na verdade, era ego… muito ego! Daquelas pessoas que temem o apocalipse e correm ao supermercado para comprar enlatados e papel higiênico. Sim, essas compraram ego! Obviamente, com suas mochilas já cheias, a ideia de transmitir conhecimento para as crianças parecia estar fora de questão… 

Uma vez entrevistaram Joana Vasconcelos, e Portugal ficou perplexo ao descobrir que ela escolheria levar um iPad para uma ilha deserta. Um verdadeiro escândalo! Este operador suspeita que as mesmas pessoas chocadas com essa escolha são as mesmas que carregam mochilas cheias de nada além delas mesmas. É apenas uma suposição!

Certo dia, decidiram reunir-se para discutir atividades, planos futuros e até mesmo sobre a encantadora temporada de Natal, entre outros temas.

A reunião estava marcada para as 21h30. Fabiana, inadvertidamente, cometeu o “crime” de chegar às 21h31, um atraso punível pela “lei do ‘vejam como eu sou bom e dedicado”‘.

Para sua surpresa, as luzes não estavam todas acesas. Uma música esquisita, com flautas e sons de ondas, ecoava pelo ambiente. A Fabiana não bateu à porta, com medo de ter se enganado na sala, mas espiou antes de ver qualquer coisa. Subitamente, uma senhora com uma Bíblia na mão, lançou um olhar de julgamento pelo breve atraso, indicou a Fabiana onde se sentar.

Ao observar a sala, Fabiana deparou-se com vinte pessoas de olhos fechados, imersas na melodia das flautas e ondas. Aparentemente, ela era a única com os olhos abertos, pensando em palavras pouco elegantes.

Este operador pode não ter sido claro na sua descrição: vinte pessoas de olhos fechados, numa sala semi-iluminada com velas (que este operador esqueceu de mencionar), enquanto uma senhora segurava uma Bíblia e discursava.

Fabiana, com um coração talvez menos puro do que aqueles com mochilas de ego, lutou para conter o riso diante da situação que era no mínimo absurda. Ela lembrou-se de documentários na Netflix sobre seitas e pensou: “Ahh, isso também existe aqui”.

Eis que a Fabiana consegue olhar para a sala e… estão vinte pessoas… vinte pessoas de olhos fechados a ouvir a musiquinha das ondas e das flautas e provavelmente a Fabiana era a única de olhos abertos a pensar em palavrões “que merda é esta?”.

A parte positiva deste cenário é que para que algo se torne realidade, tem de haver uma certa dedicação e acreditar, nem que seja estupidamente numa coisa. Ora, neste cenário, está tudo bem, porque a coisa fica mesmo à superfície! Em abono da verdade, não há grande sumo, por isso está tudo ok e fora de perigo de ser tema de um documentário!

É possível que este operador não tenha sido claro na sua descrição. 

Vamos repetir: estavam vinte pessoas de olhos fechados, numa sala a meia luz, com velas.

“Mantenham os olhos fechados. E agora pensem na história de Maria quando recebeu a notícia que iria ser a mãe de Jesus. Vamos agora ler uma passagem da bíblia”. 

Há outra senhora que se levanta, orgulhosa de fazer parte deste movimento, e lê a sua passagem. 

“Agora, lentamente, abram os olhos e pensem em como Maria se sentiu ao receber essa notícia. Como acham que ela se sentiu quando o anjo disse que ela seria a escolhida?”

Uma senhora respondeu: “Eis aqui a serva do Senhor! Faça-se em mim segundo a tua palavra.”

“Muito bem!”, disse a senhora da Bíblia.

A mesma senhora que respondeu, aparentemente conhecedora de algumas passagens bíblicas aleatórias, também era aquela que tinha dificuldade em entender que não era o centro do universo. Uma espécie de patologia, algo como o herpes! Pode até haver cura, mas nem todos têm acesso ao médico.

“Agora que estamos no Advento, pensemos o que podemos fazer, que ações podemos ter para ajudar o próximo” – diz a senhora da bíblia. 

“Eu por exemplo visitei a Rosalina, que como sabem teve um problema”

Virando as costas, num ato de emoção e lágrimas, ela continuou: “Peço desculpa, mas essas situações emocionam-me. A Rosalina, se não é santa, falta pouco para ser.” Para surpresa de todos, algumas pessoas ficaram emocionadas.

A Fabiana estava perplexa, sem saber quem era a Rosalina ou o que aconteceu com ela. Talvez Rosalina tenha aparecido nas notícias, e Fabiana simplesmente não viu.

“Eu não a conheço”, continuou a senhora emocionada. “Mas, neste Advento, vou visitá-la e dar um pouco de mim, mesmo que nem sempre tenha tempo.”

Agora, é fácil imaginar a pobre Rosalina, sem confiança com essa senhora, enfrentando a perspectiva de receber a visita de alguém que mal conhece, apenas porque essa pessoa decidiu que uma boa ação seria “dar um pouco de si” a alguém que “se não é santa, falta pouco para ser”.

As luzes foram acesas, e a discussão sobre os fatos começou. Parece que a meia-luz e as flautas fazem as pessoas ficarem mais benevolentes, e basta um interruptor para que esqueçam a situação constrangedora que acabaram de protagonizar.

Assim, com a mesma rapidez com que estava disposta a visitar uma senhora que mal conhecia por causa do Advento, ela julgou todas as interações feitas por qualquer pessoa que não fosse ela mesma.

Com a mesma velocidade que amontoou vinte pessoas numa sala para ouvir ondas e flautas, essas pessoas não conseguiram se unir para arrecadar bens para uma instituição, pois isso era algo relacionado a outro grupo.

As mesmas pessoas que suspiravam de olhos fechados num ato teatral saído de um livro ioga inspirado nas cifras.br versão premium não conseguiram sequer se organizar para fazer um cartaz de cartolina. 

A luta por aplausos em nome próprio é tão vincada que tão depressa se acende as luzes de uma sala como não conseguem abordar ideias novas… ou até menos novas… basta não ser as delas próprias! 

Ao mesmo tempo que sobem a um púlpito para proclamar em voz alta que o mundo carece de amor, descem desse púlpito e sugerem ao vizinho que regresse à sua terra. E a “terra” fica a 20km da sua… 

Estas pessoas conseguem aceitar pessoas de terras a 5000km? Acho que este operador não acredita muito nisto! 

Zoom out: O mundo é certamente mais do que uma sala meia-iluminada com colunas de música de flautas e ondas. É tão vasto que, por vezes, não o conhecemos na sua totalidade. 

Este operador acredita que há mais salas abertas com luz natural do que salas fechadas iluminadas por velas. 

Por um mundo com luz! 

Que nunca falte vontade de abrir as janelas do mundo! 

Feliz Natal! 

Operador Um.

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